Jú nos guiou pelos túneis, e o único som que ouvíamos era o de nossas botas batendo no chão. Eu me agasalhara novamente, a capa que minha mãe nos dera cobrindo nossas costas.
Minha amiga abria passagens que eu nunca imaginaria que existissem, e nos levou até um compartimento maior. Estava vazio, e Jú se agachou e pegou uma pequena pedrinha no canto. Ela a atirou com força no centro da caverna e, de repente, flechas e lasers apareceram do nada e a atingiram, e o que restou da pedra foi um minúsculo amontoado de pó.
Ela trocou um olhar comigo e com Sam, e vimos que ela estava determinada a atravessar a caverna para chegar ao outro lado, onde eu não via nada – a única saída era por onde nos havíamos vindo -, mas tinha certeza de que devia ter uma porta escondida. Sempre tinha, e se não, Jú faria com que achássemos alguma. Ela sempre fazia.
Mas o principal: como ela conseguiria atravessar aquela caverna sem virar poeira?
Minha pergunta não demorou a ser respondida.
Sem aviso, Jú saiu correndo em direção ao outro lado. Eu e meus dois companheiros abafamos uma exclamação. Flechas e lasers caíam rápidos sobre ela, mas ela desviava com habilidade. Como se fizesse isso a vida toda.
Em pouco tempo, chegou ao outro lado. Ela nos olhou, triunfante. Com o pé direito, deu um chute em um lugar exato na parede; depois, disse-nos:
- Podem vir, as armadilhas já estão desativadas – e para comprovar o que dizia, ela trocou um olhar com Sam e, já que não tinha nenhuma pedrinha a vista, ele arrancou um pedaço da parede da caverna – como se fosse a coisa mais fácil do mundo -, e atirou no centro do compartimento.
Esperamos a pedra se desintegrar, mas nada aconteceu. Depois disso, criamos coragem e, hesitantes, cruzamos a caverna. Soltei um longo suspiro quando chegamos ao outro lado intactos.
Sam deu um tranco com força na parede, e senti a caverna tremer. Uma parte dela desmoronou, e no que restou, Jú tamborilou os dedos e a parede se abriu, exibindo uma passagem.
Soltei outro suspiro, mas dessa vez me sentindo magoada e excluída. Sentia-me cada vez mais longe dos dois. Como se eles tivesses um segredo, e nunca tivessem me contado. Pareciam cada vez mais unidos, ou contra mim ou a favor de um deles. Sem nunca me incluir.
Max notou meu suspiro e me olhou preocupado. Fiz um gesto quase imperceptível dizendo que falaria depois. Ele assentiu e se encostou de leve em minha perna, o que eu sabia que equivalia a um abraço. Dei um sorriso fraco, e então senti alguém se aproximar e segurar minha mão. Surpresa, ergui o olhar e vi que em minha frente, me olhando apreensivo, estava Sam.
- Está tudo bem? – ele indagou.
Eu assenti, dando o meu sorriso fraco que dera para Max.
Ele não pareceu convencido, mas não insistiu. Deu um meio sorriso e seguiu em frente sem soltar minha mão, me puxando. Max andava atrás de nós, pensativo.
Pude ver Jú logo à frente, e não precisei ver seu rosto para saber que ela estava admirada com a rede de túneis que seguíamos.
Andamos pelo que me pareceu uns vinte minutos, até que minha amiga parou. Havíamos chegado até uma caverna quase tão grande quanto a em que Forthern ficava. Nos juntamos a ela e nós quatro ficamos boquiabertos com o que vimos.
- Como achou esse lugar? – perguntei.
- Puro instinto – ela respondeu, com um grande sorriso no rosto.
A caverna estava cheia de tendas de um tom claro de marrom, que facilmente podiam ser confundidas com as paredes do lugar.
Várias pessoas caminhavam, na maioria homens, todas vestidas com capas e botas marrom-escuras. Um deles se aproximou e disse, a voz grossa:
- Mostrem a marca.
Na hora, nem eu, nem Sam ou Max entendemos. Vi a confusão nos olhos de Jú, mas ela rapidamente foi substituída pela compreensão, e ela ergueu a manga do casaco, deixando o antebraço direito à mostra. O homem ergueu a mão até a aljava que levava nas costas e pegou uma flecha. Encostou sua ponta no braço de Jú e fechou os olhos. Era bem afiada, e parecia que iria furá-la, mas não foi isso que aconteceu. Instantes depois, a marca dos arqueiros apareceu no antebraço dela. Ele abriu os olhos, assentiu e, ainda com a flecha na mão, voltou o olhar para mim e Sam.
- Estão comigo – Jú exclamou rapidamente.
O homem se virou e encarou-a nos olhos. Os olhos negros dela encontraram os verdes dele, e os dois ficaram se olhando, um analisando o outro, pelo que me pareceu uma eternidade.
Finalmente, ele franziu a testa e falou:
- Sigam-me.
Levou-nos até uma das tendas, e no caminho vários olhares se voltaram para nós.
- Senhora – o homem falou com alguém dentro da tenda – ela está aqui.
- Deixe-a entrar.
Ele fez um gesto para que entrássemos, e assim fizemos.
Notei alguma mobília lá dentro, mas meus olhos se voltaram para a mulher no centro. Devia ter no máximo quarenta anos, e tinha longos cabelos ruivos, com olhos verdes. De estatura média e pele clara, ela era muito bonita. Usava uma capa marrom escura – assim como os outros que havíamos visto – e carregava uma aljava cheia de flechas em um ombro e um grande arco no outro.
Seu olhar se voltou para Jú e ela sorriu.
- Seja bem-vinda, Juliana. Meu nome é Jane. Estávamos à sua espera.
°°°
Minha amiga franziu a testa.
- À minha espera? Por quê?
- Já faz algum tempo que seu pai nos falou sobre você, e temos esperado por sua vinda. Ele foi um de nossos melhores arqueiros, e nos ajudou muito. Lutou em batalhas e salvou muita gente. Foi um incrível guerreiro – e Jane acrescentou mais baixo – e um grande amigo.
Jú mordeu o lábio inferior.
- Você diz tudo no passado, como se meu pai não fosse mais arqueiro...
- Em uma de suas missões, ele conheceu sua mãe, e os dois se casaram. Depois que você nasceu, ele pediu “demissão”. Seria mais seguro para você se ele não precisasse ficar o tempo inteiro saindo em missões. No dia em que veio se despedir, disse que mesmo que ele não fosse mais arqueiro, sua filha seria. Seu pai viu, no momento em que você nasceu, a marca dos arqueiros em seu braço, e soube que você continuaria o trabalho dele. Agora você está aqui, e pode fazer isso.
Ela fez um sinal para o homem que nos trouxera para a tenda e ele se aproximou. Os dois trocaram um olhar e ele assentiu, depois andou até um baú e pegou uma muda de roupa, junto de um arco e uma aljava cheia de flechas. Ele deu as roupas para Jú e os instrumentos de arqueiro para Jane.
A arqueira se virou para Jú e disse:
- Vá se trocar. Connor, mostre-lhe onde fica o vestuário.
O homem assentiu e saiu da tenda, seguido por minha amiga.
Então, Jane se virou para mim, Sam e Max.
- E vocês? O que os trouxe aqui?
Percebendo que ninguém estava muito disposto a responder, eu disse:
- Viemos aqui porque estamos em uma busca para achar os ingredientes de uma poção. Um deles conseguimos aqui no Monte Everest, com Forthern. E Jú sentiu que aqui era o QG dos arqueiros, então viemos com ela.
A arqueira nos analisou com o olhar, e depois respondeu:
- Os três já devem ter notado algumas diferenças no comportamento da amiga de vocês, e daqui para frente isso só vai aumentar. Ela ficará muito confusa, e precisará de toda a ajuda possível. Uma das habilidades de um arqueiro é que ele consegue conhecer alguém só de olhar nos olhos desse alguém. Quando vi Juliana, soube que ela seria uma arqueira tão valente quanto foi o pai dela, e no momento em que olhei para vocês três, feiticeira, mago-animal e cão, percebi que vocês todos tem um grande futuro, principalmente vocês dois – e ela olhou para mim e Sam. – São inteligentes e corajosos, e ainda superarão muitos desafio e obstáculos pela frente. E a você, Max, cabe o dever de garantir que ajam com sabedoria, e não deixar que sejam levados pelas emoções.
Ele assentiu.
Nesse momento, Connor e Jú entraram na tenda. Notei que Jú usava a roupa de arqueiro, que por sinal caíra muito bem nela. Era incrível como ela parecia se misturar ao tecido da tenda, assim como Jane e Connor, só que com a minha amiga o impacto era maior, por causa de sua pele escura, quase do mesmo tom da roupa. Ela usava uma blusa de manga curta e uma calça certas no corpo, botas de cano alto sem salto e uma capa com capuz. Notei o olhar sério que ela tinha, e me lamentei por um momento, sentindo falta da garota engraçada e alegre que eu conhecia. Rapidamente me recompus, pois não queira que ninguém notasse. Era pedir demais, pois tinha três pessoas dentro da tenda que conseguiam saber o que eu pensava, uma pessoa que sabia o que eu sentia e outra que me conhecia tão bem que também podia fazer isso. Todos notaram, e isso me fez corar. Mas foi o olhar de Jú que realmente me impressionou. Como se ela também sentisse falta dessa antiga garota e...
- Aqui está, Juliana – a voz de Jane interrompeu meus pensamentos. Ela entregou a Jú o arco e a aljava que segurava. – São para vocês.
Com os olhos brilhantes, Jú os pegou e agradeceu. O arco era feito de madeira, uma bem resistente, e sua corda era negra, da mesma cor das flechas. A arqueira mais velha sorriu e disse:
- Agora está na hora de vocês comerem.
Nesse momento, senti minha barriga roncar, e não só a minha, mas a de Sam e Jú também.
Connor nos levou para uma tenda que deveria ser o refeitório. Comemos até estarmos satisfeitos e fomos nos despedir de Jane.
- Boa sorte na busca de vocês. Se precisarem de ajuda, podem contar com os arqueiros.
°°°
Em todo o caminho por dentro da montanha ficamos em silêncio, cada um com seus pensamentos. Quando percebi, já estávamos do lado de fora.
- Para onde vamos agora? – perguntou Max, animado.
Consultei minha lista.
- Vamos atrás dos 10 pêlos de duende. Na biblioteca, eu tinha encontrado que a vila dos duendes fica no fim do arco-íris. É verdade, só que essa é a mais conhecida, assim como também é a mais difícil de chegar. Nós teríamos que encontrar um grupo antigo de feiticeiros no Congo, para nos ensinar um feitiço para fazer aparecer um arco-íris mágico, pois não é qualquer um que nos leva até a vila. Eu me lembrei de outra, uma de mais fácil acesso. Ela fica no sul da Irlanda, em uma cidade chamada Cork.
- Ah, eu conheço – comentou Sam. – Lembra aquele trabalho que fizemos na Goode? Aquele em que nós tínhamos que escolher uma das cidades da Irlanda? Você escolheu Waterford, a Jú, Limerick e eu, Cork.
- Aham – eu sorri, as lembranças vindo em minha mente.
- Vamos então! – falou Max, ansioso.
Sam assentiu, sorrindo também, e Jú concordou com um leve movimento de cabeça.
Peguei minha varinha e nos teletransportei para Cork.
Eu não fazia ideia do que estava prestes a acontecer.
____________________________________________________________________________________________________
Oie! Desculpem a demora. Aqui está o capítulo! Podem comentar ^^''' Bjs, Carol =)
Nenhum comentário:
Postar um comentário